Você já sentiu o cheiro de um bolo e foi automaticamente transportado para a cozinha da sua infância? Ou ouviu uma música que trouxe à tona memórias vívidas de tempos que pareciam mais simples? Esse sentimento tem um nome: nostalgia. Mais do que uma saudade ou um simples recordar, a nostalgia é uma força emocional poderosa que conecta nosso presente ao nosso passado de maneira profunda e, muitas vezes, paradoxal.

Neste artigo, vamos explorar o que é nostalgia, sua história, como ela influencia nossas vidas e como podemos usá-la de forma prática para transformar nossas memórias e até mesmo reescrever nossa história.


O Que é Nostalgia?

A palavra nostalgia vem do grego antigo: “nostos”, que significa retorno, e “algos”, dor. Ou seja, nostalgia é literalmente “a dor do retorno”. Esse sentimento carrega um paradoxo curioso: ele aquece o coração com boas lembranças, mas também traz uma melancolia sutil, pois nos lembra que aquilo que estamos revisitando pertence a um passado inalcançável.

Antigamente, a nostalgia era vista como uma condição médica. Em 1688, o médico suíço Johannes Hofer descreveu-a como uma doença que acometia marinheiros e soldados longe de casa. Entre os sintomas relatados estavam perda de apetite, melancolia profunda e até febre. Felizmente, essa visão mudou, e hoje entendemos a nostalgia como uma resposta emocional natural às mudanças da vida.


Nostalgia e as Transformações da Sociedade

Com o avanço da Revolução Industrial e o crescimento das cidades entre os séculos XVII e XIX, o sentimento nostálgico ganhou novas camadas. No século XIX, o movimento romântico valorizou as emoções, a imaginação e a subjetividade. Poetas e escritores dessa época exploravam a saudade da infância e de tempos antigos como uma forma de resgatar a conexão humana em um mundo cada vez mais mecanizado.

Na contemporaneidade, vivemos outro fenômeno: a nostalgia pós-moderna. Em um mundo caracterizado por incertezas, rápidas transformações tecnológicas e multiplicidade cultural, buscamos refúgio em lembranças de tempos que parecem mais simples e organizados. Não é à toa que as referências aos anos 80 e 90 estão em alta na música, na moda e no cinema.


Por Que o Passado Parece Melhor?

Muitas vezes, idealizamos o passado. Isso ocorre porque nossa memória é seletiva: tendemos a lembrar das partes boas e a esquecer as dificuldades. Por exemplo, quem viveu nos anos 80 pode se lembrar das brincadeiras na rua, mas talvez esqueça a alta inflação, as limitações tecnológicas e os desafios sociais da época.

Esse fenômeno pode ser explicado pela neurociência, e para entendermos, precisamos compreender dois conceitos básicos:

Primeiro: Repetição. As memórias que são acessadas com mais frequência são aquelas que “consolidam” melhor. Já as memórias pouco acessadas, tendem ao esquecimento.

Segundo: Ao contrário do senso comum, a memória não é armazenada como um filme que pode ser acessado na íntegra a qualquer momento. Estudos demonstram que ao acessarmos uma memória, nosso cérebro a reconstrói com base em fragmentos descritivos. E não só isso, todas as vezes que nos lembramos de algo, essa memória pode ser alterada, intencionalmente ou não, ganhando novos contornos que a tornam mais agradável ou mais dolorosa, dependendo do contexto.

Juntando as pontas : gostamos de lembrar daqueles momentos mais agradáveis, principalmente quando estamos conversando com amigos e companheiros daquela época. Isto ajuda a consolidar mais estas partes boas.


Nostalgia e Saúde Mental

Apesar de ser um sentimento comum e, muitas vezes, positivo, a nostalgia pode ter um lado mais complexo. Ao idealizar o passado, podemos desenvolver uma visão distorcida da realidade, o que nos leva a desvalorizar o presente. Por outro lado, também pode ser uma ferramenta poderosa de conexão emocional e autoconhecimento.


Como Usar a Nostalgia de Forma Positiva

A nostalgia não precisa ser apenas uma viagem emocional; ela pode ser usada como uma ferramenta prática para melhorar sua vida. Aqui estão algumas dicas:

  1. Reviva Boas Memórias com Detalhes
    Quando lembrar de algo positivo, intensifique a memória adicionando cores, sons e emoções. Imagine o sorriso das pessoas, os cheiros e as músicas que acompanhavam aquele momento.
  2. Transforme Memórias Difíceis
    Reflita sobre momentos desafiadores do passado e pergunte-se: “O que aprendi com isso? Como essa experiência me tornou mais forte?”. Ao reescrever essas memórias com um olhar de aprendizado, você dessensibiliza a carga negativa associada a elas.
  3. Compartilhe Histórias com Amigos e Família
    Conversar sobre o passado com pessoas queridas ajuda a consolidar memórias positivas, promovendo conexão emocional e humor.
  4. Busque Terapia, se Necessário
    Muitas psicoterapias, como a Psicanálise e Terapia Cognitivo Comportamental utilizam técnicas que visam ressignificar ou dessensibilizar memórias traumáticas, promovendo bem-estar emocional.

Assista ao vídeo para compreender o tema com mais profundidade.

Fontes consultadas para este vídeo :

Juhl J, Biskas M. Nostalgia: An impactful social emotion. Curr Opin Psychol. 2023 Feb;49:101545. doi: 10.1016/j.copsyc.2022.101545. Epub 2022 Dec 20. PMID: 36641833.

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Jacobsen MH. The sociology of nostalgia. Curr Opin Psychol. 2023 Apr;50:101556. doi: 10.1016/j.copsyc.2023.101556. Epub 2023 Jan 11. PMID: 36774853.

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Layous K, Kurtz JL. Nostalgia: A potential pathway to greater well-being. Curr Opin Psychol. 2023 Feb;49:101548. doi: 10.1016/j.copsyc.2022.101548. Epub 2022 Dec 20. PMID: 36669249.

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Diouglas Hoppe

Psicanalista, Amante da Sabedoria (Filósofo), Empreendedor e mestre supremo deste ínfimo pedacinho da internet.

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